Diversas matérias abordaram as regulamentações da nova lei, sancionada em julho deste ano, mas poucos artigos aprofundaram sobre como as empresas devem tratar seus colaboradores que trabalham a distância. Dúvidas em relação à carga horária da jornada de trabalho, às implicações contratuais e aos custos do empregado com equipamentos e internet, por exemplo, são comuns entre os contratantes.
PALAVRA DE ESPECIALISTA
Por isso, convidamos a advogada trabalhista Marina Camargo Aranha, sócia do escritório Tanaká, Izá e Xavier, para esclarecer as principais dúvidas relacionadas à adoção do modelo de home office. Mestre em Direito do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, a especialista orienta como as empresas devem proceder a partir de agora.
A reforma trabalhista indica que a prestação de serviço no modelo home office deve constar em contrato. Casos antigos que não passem por aditivos ou situações que não foram registradas em contrato podem ser caracterizadas como home office perante à lei?
Marina Camargo Aranha: O direito do trabalho é regido pelo princípio da primazia da realidade, ou seja, a realidade dos fatos prevalece sobre a formalidade dos documentos. Como a nova lei ainda não entrou em vigor, não há um entendimento jurisprudencial formado sobre o assunto. Mas, como a legislação traz um requisito formal para a validade da prestação de serviços em home office, é possível que os contratos de trabalho que não identifiquem essa circunstância descaracterizem o home office em uma eventual reclamação trabalhista.
Em dezembro de 2011, a nova redação do artigo 6º da CLT estabeleceu que não há diferença entre a atividade realizada no escritório da empresa e a executada na residência do colaborador, desde que esteja caracterizada a relação de emprego. Em quais aspectos essa determinação difere da nova lei?
MCA: Em 2011, o artigo 6º da CLT foi alterado para atualizar a legislação face às transformações ocorridas com o avanço da tecnologia. Assim, equipararam-se, para todos os fins, o empregado que trabalha em casa ou a distância àquele que trabalha em regime tradicional, nas dependências físicas do empregador.
Em razão dessa mudança, o fato de o empregado trabalhar em sua própria casa tornou-se irrelevante para fins trabalhistas, desde que presentes os requisitos do vínculo de emprego. Até 2011 não havia um tratamento jurídico próprio para o trabalho realizado em home office.
A reforma trabalhista pretende suprir essa lacuna, por meio dos artigos 75-A a 75-E da CLT, que estabelecem regras próprias para o teletrabalho. Assim, em síntese, a reforma trabalhista complementou o art. 6º da CLT para regulamentar o teletrabalho.
Com a reforma trabalhista, o colaborador não está mais sujeito ao controle de jornada, deixando de receber por horas extras. Por outro lado, isso também significa que as empresas não podem mais determinar o cumprimento das oito horas diárias de trabalho? Como as empresas devem proceder a partir de agora?
MCA: A reforma trabalhista inseriu um novo inciso no artigo 62 da CLT, excluindo do controle de jornada aqueles que trabalham em home office, além dos empregados externos e os que exercem cargos de confiança. Apenas esses trabalhadores não têm direito ao recebimento de horas extras, pois, por não estarem sujeitos ao controle de jornada, não se sabe quando ou quanto trabalham.
Os outros empregados seguem a regra geral da CLT, ou seja, continuam sujeitos ao controle de jornada e fazem jus ao pagamento das horas extras.
Com relação aos empregados que trabalham em home office, como a nova lei ainda não entrou em vigor, não é possível saber qual será o entendimento a Justiça do Trabalho para esses casos.
Lembramos que o empregado continua subordinado ao empregador quando trabalha em home office, podendo, inclusive, ser demandado a comparecer na empresa em algumas oportunidades.
A nova lei também define que a empresa deve arcar com parte do custo de home office? Como saber quais itens devem ser custeados pela empresa? Há um entendimento jurídico sobre essa questão?
MCA: A nova lei estabelece que as partes deverão definir no contrato de trabalho de quem é a responsabilidade pela aquisição, manutenção e fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada para o home office, bem como pelo reembolso de despesas arcadas pelo empregado.
Assim, a rigor, a lei deixa para que empregado e empregador determinem quem deverá arcar com esses custos.
Outra dúvida está relacionada à determinação de que o comparecimento esporádico à empresa não descaracteriza o regime de home office. Há limites de frequência que se apliquem à essa regra? Modelos de home office que estabelecem de 2 a 3 dias por semana em casa ainda seguem as leis de teletrabalho?
MCA: A nova lei define o teletrabalho como a prestação de serviços realizada preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias que, por sua natureza, não constituam trabalho externo.
Assim, não há um limite objetivo com o número de dias necessários para caracterizar o trabalho em home office. Mas como a lei usa a expressão “preponderantemente”, recomenda-se que o empregado trabalhe fora das dependências do empregador em mais de 50% do tempo. Ademais, como ainda não temos julgados a esse respeito, não é possível prever quantos dias da semana vão descaracterizar a prestação de serviços em home office.
Há outras questões importantes para destacar?
MCA: Com relação ao home office, a ideia da lei é que as partes tenham liberdade para negociar as condições de trabalho, admitindo-se a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual.
Para evitar interpretações divergentes, a lei também estabelece que os equipamentos tecnológicos, a infraestrutura e o reembolso de despesas arcadas pelo empregado não integram a remuneração do empregado. Ou seja, não possuem natureza salarial.
Por fim, como o empregado em home office trabalhará a maior parte do tempo fora das dependências do empregador, deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador quanto às precauções necessárias para evitar o surgimento de doenças e a ocorrência de acidentes de trabalho.
Mais informações sobre a regulamentação da reforma trabalhista podem ser consultadas com o escritório Tanaká, Izá e Xavier Advogados.
Marina Camargo Aranha
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